Priscila Bergerhoff e sua mãe Erika Marente estão à frente da marca Camaleoa
Por Nubya Oliveira
Publicado em 19 de novembro de 2025 | 06:00 / O TEMPO
O universo do empreendedorismo feminino é comumente marcado pela coragem de recomeçar e pela criatividade diante das dificuldades. Neste Dia do Empreendedorismo Feminino (19/11), contaremos histórias de mães e filhas que decidiram se unir para transformar afeto em renda e autonomia. Os negócios nasceram de parcerias despretensiosas, que se tornaram exemplos de sucesso. Confira:
Da garagem ao sustento da família
A Camaleoa, comandada por Erika Marente, 71 anos, e por sua filha Priscila Bergerhoff, 51, nasceu de um momento de necessidade, e se transformou em uma dedicação exclusiva ao couro. Tudo começou há mais de 20 anos, quando Erika cuidava da mãe com Alzheimer e precisava ficar em casa. Para ocupar o tempo e aliviar o peso emocional daquela fase, ela passou a criar acessórios com os pedaços de couro que tinha guardado na garagem.
“Minha mãe começou a fazer algumas coisas, brincos, cintos, colares. Fazia essas peças para mim, para minhas irmãs e minhas amigas. E a gente viu que todo mundo adorava. Então falei: mãe, faça mais algumas peças para eu poder vender lá no meu trabalho”, relembra Priscila. As peças começaram a circular, a demanda cresceu e, pouco tempo depois, estavam sendo comercializadas na feira do Mineirinho, em Belo Horizonte.
O couro virou marca registrada, sempre com técnicas desenvolvidas pela própria Erika, que aprendeu sozinha a misturar tintas, vernizes e texturas. “É um produto completamente diferente do que tem no mercado”, explica Priscila.
A empreendedora, que até então atuava como advogada, decidiu se dedicar totalmente ao negócio junto com a mãe. Erika destaca o quanto isso acrescentou ao negócio. “Eu tenho dificuldade para vender, que não é de agora. Então trabalho de criação, de produção, deixa comigo que eu faço, resolvo. Mas vender é muito difícil, a gente não consegue fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Aí a Priscila entrou fazendo uma diferenciação muito grande, no âmbito da venda mesmo.”
Atualmente, mãe e filha vivem exclusivamente da marca e ainda contam com a parceria de outras cinco mulheres. “O negócio é a principal fonte de renda minha e da mamãe e dessas outras mulheres que estão aqui com a gente. As nossas peças são expostas e comercializadas em várias feiras do país, inclusive na Feira Hippie, em BH”.
Priscila enfatiza que o empreendedorismo conjunto com a mãe foi uma transformação de autoestima, superando um quadro de “depressão silenciosa”. “Eu tenho uma história de depressão ao longo dos anos, e de repente assim, me transformei sem perceber. Não foi uma coisa forçada. Foi a parceira que me trouxe de novo a autoestima e me tirou daquele quadro de depressão sutil, mas terrível, porque a doença impede a gente de realizar muitas coisas,” evidencia.
A relação mãe e filha no negócio é marcada pelo respeito e por um código de comunicação para gerenciar conflitos. “A gente diverge em algumas coisas, mas criamos um código. Quando uma começa a se alterar, a gente fala assim: ‘agora calma’. E isso evita situações constrangedoras,” realça Priscila. Erika, por sua vez, reconhece o desafio de “aceitar a opinião do filho”, mas enfatiza a necessidade de “flexibilizar” e “sintonizar no canal” das novas gerações para o crescimento.
“Aqui não somos duas, somos uma”


“Eu e minha mãe somos muito unidas. E quando eu digo unidas não é simplesmente por sermos mãe e filha. Nossa conexão sempre foi algo muito raro e peculiar. Aqui não somos duas, somos uma. Por isso, criamos uma marca com identidade. Agora somos Mera.”
É com essa declaração de Camila Alves, de 36 anos, sobre a parceria com a mãe, Marilene Alves, de 63, que começa outra história de destaque no empreendedorismo feminino em Minas Gerais. Em meio à pandemia, quando decidiu que a carreira na área de eventos e marketing já não fazia sentido, Camila encontrou no lettering, arte de desenhar letras, um novo caminho. Mas foi quando sua mãe, até então enfermeira, começou a modelar cerâmicas manualmente que o negócio realmente ganhou alma.
“decidimos oficializar a sociedade, porque tudo era dividido entre nós”, recorda Camila. Com a mudança do foco e da essência, veio a mudança de nome: a marca virou Mera. E ali, mais do que peças de cerâmica, nasceu a parceria que uniu profissionalmente a vida das duas.
“Nosso diferencial está no processo. Nossas peças são feitas manualmente, uma a uma, com alma, calma e intenção. São objetos que carregam a conexão de uma mãe e uma filha que sempre foram muito unidas e que agora criam lado a lado. Temos orgulho de oferecer produtos que não são apenas lindos, são únicos. São obras que nascem das mãos da minha mãe e do olhar sensível das duas,” descreve Camila.
“Em 2021 tive a ideia de criar uma marca, que juntaria meu amor por criar mimos e presentes com a arte das letras. E foi assim que surgiu a Lettrisme. Passaram-se alguns meses, e aquela marca que tinha começado apenas com cartões personalizados, xícaras em porcelana e algumas velas, deu espaço ao universo das cerâmicas. As artes feitas com modelagem manual ganharam o coração de todos os nossos clientes. As peças eram únicas, produzidas pela mão da minha mãe com muito afeto e esbanjando sofisticação,” afirma Camila.
Com feiras, encomendas e noites trabalhando lado a lado, as duas perceberam que já tinham um negócio compartilhado, só faltava assumir isso oficialmente. Em 2023,
Retalhos de gerações

A sinergia entre mãe e filha levou Dulcimar Lima Eugenio, de 60 anos, e Luiza Lima Eugenio, de 34 anos, a empreenderem juntas em um projeto que leva leveza e inspiração a outras mulheres. Ambas estão à frente da Papos&Retalhos, um ateliê de patchwork moderno, que promove oficinas e convida outras mulheres, por meio de experiências imersivas, a viver momentos de reflexão e reconexão.
“Toda vez que eu passava em frente onde eu tive esse ateliê em São Paulo eu falava: nossa, foi a época mais feliz da minha vida”, relembra. “Então, minha filha falou: mãe, por que você não faz isso? Mas de uma outra forma. Agora que se aposentou, abrimos uma empresa, nós duas juntas, com um sentido maior de usar a arte em tecidos para as pessoas se reconectarem”, revela. E foi assim que elas se uniram para abrir a empresa em Nova Lima, na Grande BH.
“A Papos e Retalhos, o nome mesmo diz, é com muita conversa e trabalho manual feito em retalhos que a gente leva a conexão”, diz Dulci. O ateliê trabalha com oficinas individuais, em grupo ou empresas. “Normalmente a gente trabalha com quadros. As pessoas escolhem o tema, a gente ensina a fazer e elas saem com o quadro pronto”, explica. No caso de grupo de amigos, o grupo escolhe um tema para fazer a arte em conjunto.
Já no caso de empresas, o tema é voltado ao desenvolvimento humano e alinhado às questões de Recursos Humanos (RH) – área de formação da Luiza. “A empresa nos passa o problema e a gente desenvolve o tema. Então, tem uma palestra sobre o assunto, e as pessoas depois fazem uma oficina para desenvolver aquele tema”, explica. “A parceria minha e da Luísa é muito perfeita, por isso criamos a Papos, eu fiquei com a parte da arte e ela ficou com a parte dos temas”, sintetiza Dulci.
Cenário do empreendedorismo em Minas
Conforme o Sebrae, Minas Gerais é atualmente o segundo estado do país com mais empreendedoras à frente de negócios. São 967 mil empresas lideradas por mulheres, entre 2,4 milhões de pequenos empreendimentos ativos. Esses números são fundamentais para entender por que histórias como as contadas anteriormente vêm se multiplicando.
Segundo Arielle Alexandria, analista técnica do Sebrae Minas, uma das razões que explicam os números é que a maternidade e a falta de oportunidades no mercado acabam empurrando muitas mulheres para o empreendedorismo. “A maioria que empreende tem entre 31 e 50 anos. Essa é a faixa em que as mulheres se tornam mães. Muitas vezes o mercado de trabalho não absorve aquela mulher de volta. Então ela resolve empreender.”
Arielle ressalta ainda que 83% das empreendedoras têm no próprio negócio a única fonte de renda. Elas têm que lidar com dificuldades comuns, como gestão, crédito e conciliação da rotina. “Cerca de 92% dessas mulheres começaram o empreendimento com recurso próprio. Então, às vezes recorrem ao dinheiro que juntaram a vida inteira ou ao FGTS. Isso não é tão saudável. Então o acesso a crédito é muito importante para as mulheres.”
Para auxiliar as empreendedoras neste processo, o Sebrae implementou a linha Fampe Mulheres, que oferece 100% de garantia nas operações de crédito realizadas por mulheres empreendedoras. O benefício é concedido a negócios em que elas sejam sócias majoritárias ou atuem como sócias.
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